“Permínio” é um projeto de resgate de memória do grande escritor nordestino Permínio Asfora, o primeiro brasileiro de origem palestina a publicar um romance, e autor da primeira novela com um protagonista Palestino, no Brasil. Meu projeto humildemente se une aos esforços da família Asfora e de universidades nordestinas, de fazer jus a esse grande autor brasileiro, injustamente apagado do cânone literário nacional.
Por causa do seu claro posicionamento político — que era radical, popular e antilatifúndio — Permínio foi perseguido e censurado por duas ditaduras brasileiras (a varguista de 1937-1945 e a empresarial-militar de 1964-1985), além de escanteado pelos críticos liberais de seu tempo. Mesmo tendo sido premiado, publicado pelas maiores editoras do Brasil e ter, entre seus fãs, nomes como Guimarães Rosa, Jorge Amado e Nise da Silveira, Permínio foi completamente apagado do cânone nacional, a ponto de não haver reimpressão de sua obra em grandes editoras há mais de 30 anos (há reedições independentes, bravamente organizadas por seus familiares, e uma reedição maravilhosa de Sapé, produzida pela Universidade Federal da Paraíba, em 2015).
O apagamento de Permínio não se dá por sua obra estar aquém da de seus contemporâneos, nem por ser esteticamente inferior ou datada — muito pelo contrário. Os temas centrais da obra asforiana — autodeterminação e direito à terra — são mais relevantes do que nunca! A obliteração desse grande escritor brasileiro acontece porque Permínio, ao contrário de tantos escritores de seu tempo, nunca abriu mão de seu horizonte político em troca de louvores literários. Diferente de tantos golpistas e oportunistas (de ontem e de hoje), ele nunca afrouxou seu sonho de reforma agrária e poder popular, e sempre levou a política para a sua literatura. Por último, mas não menos importante, ouso dizer que a exclusão de Permínio do cânone literário nacional tem raiz na xenofobia antiárabe e antinordeste.
Nascido no Piauí e criado na Paraíba, Permínio Asfora foi o escritor preferido do meu avô, Raimundo Bezerra da Silva. Carinhosamente chamado de Seu Mocinho, vovô foi agricultor familiar e pequeno criador de cabras do agreste pernambucano, além de ambientalista e organizador comunitário em Gravatá do Jaburu, no Alto Capibaribe, microrregião do Agreste pernambucano, quase na fronteira com a Paraíba.
Para a pesquisa do meu quinto livro de poesia, ASMA, o quarto livro de Permínio, Vento Nordeste, foi inspiração crucial, porque era o livro de cabeceira de vovô. Por esse motivo, o meu livro é dedicado a eles dois (além de mamãe e as La Ursas do mundo). Mas toda a obra asforiana permeia meu imaginário e, consequentemente, minha escrita. Esse projeto é minha humilde tentativa de agradecê-lo por tudo.
“Permínio” incluirá uma série de oito postagens (entre dezembro de 2024 a fevereiro de 2025) sobre a biografia e bibliografia de Permínio Asfora, aqui na nius, e a criação de um perfil do escritor no Wikipedia (fevereiro de 2025). Todo o resultado dessa pesquisa será reunido no meu website.
O projeto é diretamente inspirado no trabalho “Wikipedia Maria”, do artista visual Cicero Costa. Sobre "Wikipedia Maria", Cicero escreve: “Sempre fui muito curioso, para entender e escutar as histórias de família, como a maioria de nós, sempre esbarrava num limite muito próximo de ausência de registro, de falta de cultura própria, sem saber bem da onde vem meus antepassados, essa coisa de ‘Quem somos?’. Acho que para muita gente é essencial reivindicar uma história ou sua parcela nela. Pensando nisso criei uma página no Wikipédia da minha mãe, (Maria Alice da Silva Costa), para mostrar um pouquinho desse ser tão maravilhoso. E também de alguma forma reivindicar esse lugar, e construir uma narrativa nova para as próximas gerações, uma narrativa de muita luta e principalmente de muito amor. ‘Se nois não consegui buscar, nois cria’.”
Cicero Costa é o pseudônimo de Wallace da Silva Costa, cujo trabalho conheci através de outra artista visual, Jéssica Mangaba. Ambos nasceram em São Paulo mas, sendo filhos de migrantes nordestinos, têm a questão da emigração e da ancestralidade nordestina como quase-cerne de suas pesquisas. Jéssica cresceu na região de Guaianases e Itaquera, periferia da Zona Leste. Já Wallace é cria do centro de São Paulo, e cresceu entre os bairros do Bixiga, Baixada do Glicério e Brás. Agradeço profundamente a esses dois queridos amigos, Wallace e Jéssica, por serem eterna forte de inspiração e reflexão.
#palestinalivre
Mulher, que lindo! Fiquei emocionada! Com vontade de ler Permínio, de saber mais sobre seu avô (que já é uma figura querida por mim, que lhe acompanho há tempos).
Bonito isso do Cícero. Sabe que recentemente vi um documentário sobre os indígenas em Araucária-PR, minha cidade. Documentário feito através da lei Paulo Gustavo, que minha irmã trabalhou como antropóloga e roteirista. E depois de assistir a sessão pública que fizeram no teatro da cidade, eu fiquei com essa sensação de criar um lugar de pertencimento. Somos descendentes de indígenas e nordestinos, mas não sabemos da nossa história, dos detalhes. Assistir ao documentário me devolveu algo da minha subjetividade. É isso, se não conseguir buscar, nois cria!
Ne começou direito e já tô agradecida.
Obrigada por me apresentar esse conterrâneo de quem eu nunca tinha ouvido falar.